Privatização dos presídios é a solução para o Brasil?
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Privatização dos presídios é a solução para o Brasil?Foto: Fotos Públicas Depois das rebeliões em presídios que ocorreram no início do ano de 2017, os veículos de comunicação passaram a dar mais atenção e relevância aos debates acerca do sistema carcerário brasileiro. Percebeu-se a urgência em discutir essa questão, considerando principalmente o dado de que o Brasil tem, atualmente, a 4ª maior população carcerária do mundo, com mais de 600 mil pessoas encarceradas – dados de 2014. Nessas discussões, aflorou a ideia de investir na privatização dos presídios do país, consequentemente investindo em prisões e penitenciárias privadas no país, como uma e este contexto de privatização dos presídios? O BRASIL JÁ PRIVATIZOU SEUS PRESÍDIOS?Como já foi dito, a discussão sobre o sistema prisional brasileiro ficou nos holofotes midiáticos por conta de rebeliões nos presídios no início de 2017. O debate em si sobre as questões que permeiam esse sistema, a busca de soluções e alternativas, porém, é
bastante antigo para quem lida com o sistema penal e carcerário. Assim
como é antiga a discussão sobre a operação privada das prisões. Mas,
afinal, o que significa isso? A realidade brasileira na gestão dos presídiosNo Brasil, a gestão é pública em mais de 90% das suas unidades
prisionais. A administração é 100% pública ou perto disso em 15 estados.
Em contrapartida, existem estados que contam com co-gestões – contratam
empresas privadas para alguns serviços específicos ou até mesmo para auxiliar na organização do presídio –, como o Amazonas e a
Bahia, em que aproximadamente 25% das unidades funcionam nesse regime.
Mas o que realmente está em interesse quando se comenta em “privatizar” os presídios, é a criação de parcerias público-privadas, que apenas o estado de Minas Gerais possui no momento. POR QUE SE FALA EM PRIVATIZAR OS PRESÍDIOS BRASILEIROS?O principal objetivo em estabelecer uma PPP é a de repassar certos serviços públicos ao setor privado e “desafogar” parte do trabalho estatal na condução dos presídios.
Os defensores da medida falam que é uma alternativa ao déficit de vagas
no sistema carcerário público, além de ser uma forma de garantir um
tratamento mais digno aos presidiários, que muitas vezes passam por
violações graves de direitos humanos nesses ambientes. Há diversos argumentos a respeito, tanto a favor como contra essa
iniciativa, que traremos ao longo desse post, juntamente com informações
sobre o que já acontece em presídios que foram “privatizados” no Brasil
de alguma forma. O
que se chama de “privatização das prisões” é, na verdade, uma parceria
público-privada entre o Estado e uma empresa que tenha interesse. Vamos entender melhor o que é isso? As PPPs nos presídios brasileirosA Lei 11.079, de 2004, discorre sobre normas gerais para licitação e
contratação de parceria público-privada no âmbito da Administração
Pública. A PPP pode ser feita de duas maneiras: 1) na modalidade
patrocinada; 2) na modalidade de concessão administrativa. A parceria com a iniciativa privada em relação a um presídio é feita numa das modalidades das PPPs, chamada concessão administrativa.
Nela, uma empresa será responsável por tudo o que o Estado antes tinha
dever de fornecer: desde a construção da estrutura, até a contratação de
funcionários e administração da penitenciária. Apesar disso, a PPP não
anula a ação do poder público, que deve continuar fornecendo policiais
para agir nas penitenciárias e fiscalizando as ações da empresa
responsável pela administração do local. Para que haja essa parceria, deve haver um investimento da empresa privada de no mínimo R$ 20 milhões.
Esse investimento será pago de volta à empresa pelo Estado no decorrer
dos termos do contrato, que deve ter duração de 5 a 35 anos. É
importante salientar que cada contrato é realizado individualmente,
podendo haver várias diferenças entre eles. Ao Estado caberá zelar pelo cumprimento do contrato, os serviços que
assumiu e pela qualidade da infraestrutura do presídio. Fora isso, cabe
ao poder público pagar um valor pela reclusão de cada detento à empresa
privada. A PRIVATIZAÇÃO DOS PRESÍDIOS SOLUCIONARIA OS PROBLEMAS DO SISTEMA CARCERÁRIO?Os objetivos do Estado, de acordo com o relatório de 2014 do Departamento Nacional Penitenciário, são a diminuição de gastos com o sistema prisional, buscando a também diminuição do número de prisões. Quanto aos presídios já existentes,
o poder público visa a um tratamento mais humano com os detentos, com a
redução do déficit de vagas nas penitenciárias, fiscalização do
trabalho dos agentes penitenciários e devidas punições nos casos de
abusos. OS DEVERES DO ESTADO SERIAM CUMPRIDOS NOS PRESÍDIOS PRIVADOS?O Estado tem obrigações constitucionais, como a de fornecer e verificar a
qualidade de alimentos, roupas, da infraestrutura, de atendimento
médicos, da educação fornecida, do trabalho proposto, entre várias
outras. Sendo um presídio público ou um presídio privado, a fiscalização
é uma premissa do poder público, invariavelmente. Toda penitenciária deveria ser fiscalizada pelos órgãos públicos. A
fiscalização abrange o recebimento e a alocação de recursos, a sua
gestão e administração e a prestação de serviços. Só assim é possível
saber se estão sendo seguidas as recomendações conforme mandam as leis. O professor de direito Cláudio Suzuki, expressa em seu artigo que “se
o poder público deixar de fiscalizar as exigências contratuais como
deixa de verificar suas próprias penitenciárias, teremos como resultado a
mesma situação vivida nos presídios públicos com o agravante do
prejuízo para o erário”. Portanto, sem a fiscalização, não seriam atingidos os objetivos
nem de melhorar as condições de vida dos presidiários e dar a eles um
tratamento mais humano, nem o de uma administração mais bem feita dos
locais ou da redução da taxa de encarceramento. Por outro lado, o advogado criminalista Luiz Flávio de Borges escreveu na Revista Superinteressante que
o modelo de co-gestão dos presídios permite o Estado administrar com
mais zelo as questões jurídicas relativas aos presos, como punições e
penas. Considera ainda que há uma vantagem na terceirização dos
presídios, pois “se houver qualquer irregularidade, corrupção ou
outro desvio, o funcionário é demitido, resolvendo-se o problema.
Diferentemente do espaço estatal, onde tudo depende de sindicância,
processo, etc.”. Quanto ao bem-estar dos presidiários, coloca que as atrocidades e humilhações sofridas têm de ser evitadas e que “as
unidades prisionais privadas podem preservar a dignidade do preso, de
modo especial se estivermos tratando do provisório, que ainda não foi
julgado e que pode ser absolvido”. A PRIVATIZAÇÃO RESOLVEU OS PROBLEMAS DO SISTEMA PENITENCIÁRIO EM OUTROS PAÍSES?Os Estados Unidos tiveram um aumento de 800% da sua população carcerária entre os anos de 1980 e 2013,
portanto, aumentou em 9 vezes. Esse efeito foi um reflexo da política
de “guerra às drogas” dos presidentes Nixon e principalmente Reagan, que
adotou políticas punitivas muito extremas no país. A superlotação de
seus presídios e constante demanda de vagas no sistema prisional fez com
que recorressem à privatização de penitenciárias. Os números de encarceramento nos EUA são 8 vezes maiores que de países
como França, Itália, Alemanha, 14 vezes do Japão e o dobro da África do
Sul no ápice da luta contra o apartheid. Tendo estes resultados em vista
muitos sustentam que os EUA vêm provocando um inchaço de detentos com o
passar dos anos. Dos atuais 2,3 milhões de prisioneiros dos EUA, 22.164 estão em
presídios privados federais. O restante das pessoas paga suas penas em
presídios federais públicos ou presídios estaduais – públicos ou
privados – e em cadeias públicas. Cerca de 10% das prisões americanas
são privatizadas; a criminalidade e a taxa de encarceramento, porém, não
diminuiu com o serviço dos presídios privados. Os Estados Unidos, porém, está revisando todo o seu sistema prisional.
Tem revisto principalmente suas políticas de sentenças e diretrizes de
sentenças para crimes relacionados a drogas – devido às políticas
antidrogas rígidas seguidas por vários presidentes estadunidenses – e,
por isso, desde 2013 a população carcerária vem declinando de forma
progressiva e constante. A subsecretária de Justiça dos EUA, Sally
Yates, fez um pronunciamento no fim de 2016, sobre a intenção do Departamento de Justiça em fechar presídios privados no país. “As prisões privadas tiveram papel importante durante um período
difícil, mas o tempo mostrou que têm desempenho inferior se comparadas
às nossas instalações (administradas pelo governo). (…) Não
oferecem o mesmo nível de serviços correcionais, programas e recursos,
não apresentam redução significativa de custos e não mantêm o mesmo
nível de segurança e proteção”, disse Yates. COMO FUNCIONAM OS CASOS DE “PRIVATIZAÇÃO” DE PRESÍDIOS NO BRASIL?Saindo da teoria, vamos falar sobre dois casos aqui: os presídios que
são administrados por empresas privadas, mas continuam sendo públicos; e
o de um único presídio brasileiro feito por uma PPP, que seria o caso
de um presídio privado. Guarapuava: penitenciária com gestão privatizadaA penitenciária de Guarapuava, no Paraná, tem uma reincidência criminal
– pessoas presas mais de uma vez – de 6%, bastante abaixo da média
nacional, de 24,4%. No presídio, foi realizada uma licitação pelo
direito de coordenar suas atividades internas. A empresa vencedora do
edital contratou 140 funcionários e mantém um regime em que quase todos
os presidiários trabalham dentro do presídio. O governo do Paraná,
porém, paga para a empresa R$ 1,4 mil mensais por interno, de acordo com
este artigo. Ribeirão das Neves: Penitenciária totalmente privatizadaEsse é o caso do presídio de Ribeirão das Neves – MG, que tem uma
empresa responsável por toda a sua administração, além dos serviços de
controle, monitoramento e segurança dentro e fora da unidade prisional.
Devem promover a educação dos presidiários e possibilitar a eles um
trabalho dentro da penitenciária. A estrutura de organização do complexo
conta com dois diretores de segurança, um do setor público e outro do
privado. O custo dos presos em penitenciárias públicas varia muito com relação ao
estado, mas a média nacional gira em torno de R$ 2.400,00. Na PPP de
Ribeirão das Neves, são pagos pelo governo estadual R$ 2.700,00
mensalmente por cada preso. Houve um investimento de R$ 280 milhões por
parte da empresa, segundo a reportagem da Agência Pública, que deverá
ser pago pelo poder público dentro dos 27 anos de contrato –
prorrogáveis por até 35. O slogan do complexo penitenciário de Ribeirão das Neves é “menor custo e maior eficiência”.
Mas o que significa essa eficiência? Dois casos de eficiência possível
no sistema prisional: diminuição do número de prisões e efetiva
ressocialização de um preso. Contudo, no caso de um presídio privado, a
eficiência é exatamente o aumento do número de prisões. Tendo em mente o interesse público
de menores taxas de encarceramento, tratamento digno aos presos e menor
gasto público com prisões, é imprescindível o questionamento: quanto
uma empresa de fato estaria interessada na ressocialização de um preso
frente ao lucro que obtém de seu encarceramento? Por exemplo, uma das obrigações do estado de Minas Gerais com relação ao presídio é manter uma “demanda mínima de 90% da capacidade do complexo penal, durante o contrato”.
Ou seja, durante 27 anos, 90% das 3336 vagas devem estar sempre
ocupadas. Em entrevista à Agência Pública, Robson Sávio, coordenador do
Núcleo de Estudos Sociopolíticos (Nesp) da PUC-Minas e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, disse que acredita numa eficiência não voltada à ressocialização dos presos, mas sim a um maior número de prisões. Fontes: Números não apontam benefícios em cadeias com participação privada – Agência Pública; Quanto mais presos, maior o lucro – Agência Pública; Política criminal e presídios privados; Como funciona o primeiro presídio privado do país – Pragmatismo Político; Como funciona um presídio particular – Superinteressante; Âmbito Jurídico; Presídios EUA – Conjur; Relatório Infopen dezembro 2014; Parcerias público-privadas; Reincidência carcerária no Brasil – Piauí; Quanto custa um preso no Brasil – Politize!; Perfil da população carcerária brasileira – Politize!. Depois da elucidação dos argumentos sobre a privatização dos presídios no Brasil (ou a não privatização), o que você pensa a respeito? Deixe seu comentário! | A A |
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